quinta-feira, 26 de junho de 2014

prejuízo

quanto eu devo por ter dito? e por não ter dito? vão cobrar? preciso pagar? qual a extensão do prejuízo? corresponde à culpa? se corresponder, está pago? quanto custa falar? e não falar? avaliam a coerência? avalizam? eu mesma endosso? a dúvida compromete? o medo ajuda? pode dar desconto? o erro aumentou o risco? a covardia protege? a coragem compensa? o custo-benefício vale?

sábado, 21 de junho de 2014

samba

a samba é minha cachorra. o gênero do artigo está errado, porque, na verdade, está certo. a samba lelê, a samba que agoniza mas não morre, eu sou a samba, desde que a samba é samba é assim, e quem suportar uma paixão, saberá que a samba então nasce no coração, a samba pede passagem, não deixe a samba morrer, esta samba é só por que, rio eu gosto de você, tem muita samba, muito choro e rock'n'roll, a samba da minha terra deixa a gente mole, a voz da minha samba ninguém vai calar, os originais da samba, vai minha samba, a samba puro de amor.

sábado, 14 de junho de 2014

foco narrativo

duas demonstrações recentes da ideia de que o foco narrativo significa a distância maior ou menor que o narrador assume diante do personagem e que, em função disso, todo personagem é complexo, quando visto de perto: um) uma manicure, com quem conversei, é jogadora de futebol. jogava em goiás, mas precisou vir a são paulo para trabalhar. velha demais para ser aceita em algum clube, joga no time masculino do marido. não é que eu goste de futebol, eu amo. é uma paixão, uma fascinação. enquanto assistíamos ao jogo camarões e méxico, ela me ensinou todos os impedimentos. dois) o vendedor de queijos do sacolão é croata, casado com uma japonesa, que conheceu num navio de cruzeiro. ela trabalhava na cozinha e ele na área de cargas. se apaixonaram e, como ela é filha de brasileiros, vieram para cá e trabalham com laticínios. ele tem, na parede da banca do sacolão, um prato de cerâmica com o mapa da croácia e sua cidadezinha em relevo. a bandeira croata escondida no balcão está dobrada ao lado da brasileira, propriedade de sua mulher japonesa.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

namorados

eu te dou minha palavra, amor: lavoura, açum-preto, costura, água, pistilo. qual você quer? quero água, amor, é a mais bonita. tudo bem. essa também é a que eu mais gosto, mas eu te dou.

domingo, 8 de junho de 2014

buraco

pelos buracos do corpo - olhos, ouvidos, nariz, boca, poros, ânus, genitais - saíram todas as palavras, grudadas: barulhodeninguémcomacentonoaagudoporquenãotemtiloqueéotilque acentoesquisitosemordemsemgatosemscuspequeridículoessabrigadofacebookentreninguémetodomundo.
sobraram muito poucas palavras e nesse espaço vazio entrou um golpe de ar que balançou algumas estruturas fixas do inconsciente. a fase oral se deslocou levemente do lugar e a anal deu uma mexidinha. à noite não tive pesadelos.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

facebook

ando pensando se há determinações midiáticas e linguísticas no instrumento facebook. é muito difícil concluir, mas me parece que há algumas: radicalização dos discursos; esvaziamento (direta e reciprocamente ligado à radicalização); efemeridade; polarização (diferente, mas contígua à radicalização); certa inconsequência (no sentido literal, de não ponderar a sequencialidade e o tempo dos discursos); redundância; tautologia (algo está certo e evidente porque eu o estou dizendo). estes são alguns dos aspectos negativos, mas há os positivos também, que ficam para outra.