segunda-feira, 31 de outubro de 2016

confiança

uma reação comum, quando apresento uma interpretação surpreendente de algum texto literário, é perguntar: "mas será que o autor pensou mesmo nisso?". acho estranho, para ser delicada. é um tipo de negação da própria surpresa, do espanto estético, da confiança na potência criativa. antes de entregar-se à credulidade, é melhor armar-se de desconfiança: será mesmo? mas em que mesmo a desconfiança ou a comprovação impossível de que o autor teria ou não teria pensado naquilo modificam o espanto interpretativo? em que reside a superioridade inútil de achar que, caso o autor não tenha pensado nesse efeito, a grandeza passa a ser menor? penso que é uma espécie de sub-produto, para o lado estético, do fetichismo hábil da descrença. como descrer é fácil! acreditem, se quiserem gostar de literatura. acreditem nas interpretações mais absurdas, se elas lhes parecerem convincentes, e garanto que serão mais felizes na confiança inútil da ignorância sobre as escusas ou lídimas intenções dos autores.

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